FABRÍCIA PEIXOTO
da BBC Brasil em Brasília
Com o desastre que abateu o Haiti, a diplomacia brasileira para o país caribenho deverá entrar em uma nova fase, na avaliação do Itamaraty. A expectativa é de que o governo brasileiro seja "mais exigido", mas em contrapartida poderá consolidar seu papel de liderança no processo de paz haitiano.
Na avaliação de diplomatas, o trabalho de recuperação política do Haiti, que já era considerado "complexo", vai exigir um compromisso ainda maior do governo brasileiro.
A expectativa é de que, depois da fase emergencial de socorro às vítimas, os países que integram as forças de paz, juntamente com as Nações Unidas, "reavaliem as prioridades" da operação.
Como membro não-permanente do Conselho de Segurança da ONU, o Brasil "tem a chance de fazer valer suas perspectivas e visões" em relação ao Haiti, diz um representante da diplomacia brasileira.
"Quem decide é a ONU, mas o Brasil sempre defendeu uma política mais de longo prazo no Haiti, que vá além da segurança", diz o diplomata.
Uma das possibilidades é de que o efetivo da missão de estabilização da ONU no Haiti, a Minustah, seja ampliado - decisão que precisa ser aprovada pelo Conselho de Segurança.
De acordo com essa mesma fonte do Itamaraty, "não necessariamente" o adicional de tropas precisa sair do Brasil.
"Um dos desafios é justamente o de convencer outros países de que eles também precisam contribuir mais", diz o diplomata.
Antes do terremoto, a previsão era de que as tropas pudessem ser reduzidas a partir de 2011, o que também deverá ser revisto.
Protagonista
País com o maior efetivo militar no Haiti, com 1.266 homens, o Brasil acabou conquistando um papel de protagonista no processo de paz do país caribenho.
A causa foi abraçada não apenas do ponto de vista militar, mas também diplomático, sendo vista como uma das principais bandeiras da política externa do governo Lula.
Além de reforçar sua influência na América Latina, a experiência militar brasileira no Haiti é vista no governo como mais um ponto favorável à campanha do Brasil por um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
O general Carlos Alberto Santos Cruz, que comandou a Minustah de 2007 a 2009, diz que o governo brasileiro tem oferecido apoio financeiro e treinamento à operação e que esse "esforço deu um maior conceito ao Brasil".
"Não é a toa que a missão de paz, que na verdade é da ONU, muitas vezes é confundida com uma missão brasileira", diz.
De acordo com a ONG Contas Abertas, o governo brasileiro já gastou mais de R$ 700 milhões com a operação desde o início da missão.
Revisão
Apesar de os militares da Minustah serem treinados para situações de catástrofe, a missão não tem em seu mandato a "reconstrução física" do país, diz o representante da diplomacia brasileira.
A ideia, segundo ele, é de que outras agências da própria ONU se alinhem aos compromissos da missão de paz.
"Estamos falando da reconstrução de um país praticamente do zero, e não apenas mais de uma questão política ou de segurança", diz. "Por isso acredito que as operações no país terão de ser repensadas", acrescenta.
Para o general Santos Cruz, a discussão nesse momento é "puramente humanitária", mas, segundo ele, "em algum momento o Conselho de Segurança deverá discutir o futuro do Haiti".
"Parte do trabalho que já havia sido feito no país nos últimos seis anos foi perdido. Tanto o componente militar como civil da missão terão de ser reavaliados", diz.
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